terça-feira, 22 de abril de 2008

Cana brava

- O negócio da cana ta esquentando, hein mano?

- Que negócio da cana, mano?

- Esse negócio de plantar cana em todo lugar. Tão dizendo por aí que não vai sobrar terra pra plantar comida. E a gente vai comer o quê?

- Cana?

- Comer cana, Mané? Se liga! De vez em quando é bom tomar um caldo de cana, comer melaço, rapadura, essas coisas. Mas comer cana não dá, ainda mais todo dia.

- Mas será que é verdade esse negócio de não ter terra pra plantar arroz e feijão? O Brasil é muito grande, cara. Acho que dá pra plantar cana e feijão, tranqüilo.

- Sei lá. Os gringos disseram que vai faltar comida no mundo todo se as plantações de cana crescerem do jeito que tão crescendo.

- Ah, peraí. Essas conversas de gringo não dá pra acreditar assim não, mano. Já disseram tanta besteira sobre o Brasil que não dá pra botar fé no que eles dizem.

- Com certeza, com certeza. E tem mais. Parece que os Estados Unidos tão fazendo pior que a gente, porque o álcool que eles fazem lá prejudica muito mais a fome no mundo que o nosso álcool. Eles tiram álcool do milho.

- Do milho?? Ué, mas eu pensei que do milho só saía fubá, pipoca e ração. Dá pra tirar álcool do milho também?

- Eles tiram. De que jeito não sei, só sei que tiram.

- Pô, mas aí é sacanagem, porque o milho dá pra comer muito mais que a cana. Dá pra assar a espiga, cozinhar com água e sal, fazer pamonha, curau, canjica, fubá. Até mel de milho tem por aí, aquele tal de Karo.

- Pois é, mano. E por isso também o álcool deles é bem mais caro que o nosso. Fazer álcool de milho dá mais trabalho, custa mais caro e rende menos que o nosso, de cana de açúcar.

- Então estamos por cima nessa, hein mano! Nosso álcool é mais barato e rende mais que o dos americanos. Vamos vender muito mais que eles. Até onde eu sei não dá pra plantar cana lá nos Estados Unidos.

- Talvez dê, mas não tanto quanto aqui. Em matéria de cana o Brasil é campeão.

- A taça do mundo é nossa, mano! No futebol e na cana.

- É, mas voltando ao assunto, tão dizendo que a gente precisa plantar mais comida.

- E a gente não planta? Esses dias mesmo vi na televisão que a safra vai ser maior que a do ano passado, que já tinha sido maior que a de 2006. Comida não ta faltando aqui.

- Mas ta faltando no resto do mundo, ou pelo menos na África.

- Pô, mas na África sempre faltou comida, desde que eu me conheço por gente. Todo ano sai na TV alguma notícia sobre fome na África. Mas como é que eles passam tanta fome lá? A África é quase do tamanho do Brasil, não é? Eu lembro que no atlas da escola a gente via a África grandona, num formato até parecido com o do Brasil.

- Grande ela é, mas não é um país só, são vários. E a maioria é pobre, na miséria mesmo, que nem as favelas do Rio e São Paulo.

- Mesmo assim, por que é que eles passam fome lá? Não plantam comida nenhuma?

- Não sei, devem plantar alguma coisa. Parece que plantam café, banana, trigo e não sei mais o quê. Mas o negócio pega mesmo é na parte política. Os caras não se entendem por lá. É guerra atrás de guerra. Deve ser por isso que não tem comida. Passam tanto tempo em guerra que não têm tempo pra plantar.

- Sei lá, mano. Mas e aí? Se a gente plantar menos cana e mais comida aqui no Brasil, resolve o problema deles lá na África? A gente vai vender comida mais barato pra eles?

- Não sei. Mas aí fica complicado né? O povo aqui pagar mais caro pela comida do que o pessoal da África, que tá longe pra caramba.

- Acho que não seria justo com o povão do Brasil.

- Também acho. Mas isso é complicado. É negócio pros políticos pensarem.

- Xiiiii. Já vi tudo. Bom, enquanto isso, o melhor que a gente faz é prestigiar o produto nacional.

- Com certeza. Ditão, manda mais duas cachaças pra cá.

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